sábado, 17 de novembro de 2012




Era a paz de quem prepara um derradeiro suspiro. Tudo se organizava ao seu redor. Meticulosamente arrumado como quem traça um mapa. Segui-lo, jamais conduziria ao engano. Apanhava docemente todas as pontas penduradas. Depois, poder-se-ia entregar apenas a tecer os dias distantes que viriam. Vivia do que seria um dia. Na incerteza de alguma vez os alcançar não aguardava o amanã.
Apreendera os princípios do filósofo. Encontrara nas suas palavras a compreensão para o que sempre fora. Achara-se através dele e com ele se desvaneceu toda a esperança de um caminho a seguir. Trilhara-o já. Sempre o trilhara, aliás, sem a compreensão de que o fazia. Compreendê-lo apaziguara-a e lançara-a num abismo. Era inteiramente livre agora. Não pertencia a lugar algum e jamais caminharia de mão dada rua fora. Os lençóis, alvos, esticados, sem rugas de corpos agitados, permaneceriam um aconchego sempre frio, solitário, contudo, pousava a cabeça na almofada e sorria quando o sono tudo cobria de sossego. Porque agora não se debatia, concebia, agradava-lhe ser quem era. Sabia por que nunca haviam sido possíveis os entendimentos. Descortinava com clareza por que não havia quem permanecesse, por que ela também não resistia.
Hoje assistia imperturbada aos caminhos trilhados ao seu redor cujo desfecho conhecia bem. Encaminhavam-se na sua direcção e a cada passo se afastavam, sem percepção, fustigados. Assistia e adivinhava inerte. Deixava-se ficar em silêncio.
E era tamanha aquela paz...

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