Cartas que o tempo não escreveu

Estou bem.

Preciso de espaço para poder escrever, físico e interior, que parecia não encontrar. O meu esconderijo perdeu o conforto de outros tempos. Invadiram-no como quem me entra alma adentro e estraçalha tudo em seu redor.

Preciso de um tempo que não existia em mim, de uma energia que canalizei para um caminho que se me impôs. Não consegui fazer as duas coisas em simultâneo. Andei estonteada, meio perdida.

Ontem à tarde, enquanto vigiava os miúdos que brincavam, deitei-me na cadeira de baloiço e não sei se cheguei a adormecer porque os ouvia, mas sonhei. Sonhei com uma flor que tenho algures. Uma flor tão linda que me faz sempre sorrir, me enche de alegria só de existir na minha vida. Acompanho-a sempre e penso nela a toda a hora mas nem sempre lho digo. Vi-a receosa lá tão longe e quero que sossegue. Senti a sua inquietação, como se estivesse ali ao meu lado; como se me falasse com o seu ligeiro sotaque de flor de que tanto gosto e me mata as saudades que são tantas. Vi-lhe os olhos,  emocionei-me e estremeci de tão real me pareceu o sonho. Beijei-lhe as pétalas com cuidado, uma a uma. Cobria-a de carinhos de seda e parti em busca de um cantinho aconchegante.

Um dia irei buscá-la, talvez.