sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

A sorte bafejou-me


Tive o privilégio de ter um filho especial. Caiu-me nos braços com um propósito. Chegou, julgo, no momento certo. Com outra idade, talvez eu não tivesse capacidade para ver o tanto que me veio mostrar. Não teria maturidade para criar um menino como ele. Não poderia largar tudo e dedicar-me exclusivamente a si quando foi necessário. Não teria sido mãe da forma que eu queria ser.
Veio ao meu encontro para me ensinar tudo o que sei hoje sobre a vida e os homens. Antes dele, julgo que me limitei a passear pelos dias, os sentimentos e as emoções, tocando tudo ao de leve. Vivia encerrada num mundinho fechado e restrito para o qual fui formatada para pertencer, onde permanecia desconfortável sem saber como sair. Rompi com tudo tudo e agora vivo. Tudo é intenso e vibrante. Extenuante. Raramanete os dias são pardos.
Segurando a sua mão aprendi o amor incondicional. Descobri que o amava tanto que doía, soube também que talvez pudesse vir a amar outras pessoas com um outro amor desconhecido. Ele veio para me despir o coração, para que eu aprendesse a aceitar o outro, a gostar sem limites nem barreiras. Tornou-me mais pessoa. Deixou-me desprotegida, é certo, mas pulsante. Disponível e aberta. Receptiva. Por isso, um dia dei por mim com vontade de voar, de me embrulhar na vida, e de gritar ao mundo que sou como sou porque o meu filho me ensinou.Tenho ao meu lado um tesouro inesgotável.
Ele fez-me desabrochar. Abriu-me os olhos e deu-me um novo olhar. Pôs-me todos os sentimentos ao rubro.
Com ele tenho derramado lágrimas de sangue, sofrido desesperadamente. Só com ele soube que a felicidade também se chora. E agarrados um ao outro já nos emocionámos tantas vezes de alegria. Com ele, dou gargalhadas estrondosas, sorrio, salto, pulo e danço. Não me contenho. Perco a timidez. Sou muito mais criança do que ele. Perco o sono, passo noites sem dormir, tenho medo de falhar, angustio-me.
Não escondo quando me entristece, nem os sorrisos que me provoca, o orgulho que me causa, a felicidade que me traz. Sou transparente. Sou frontal. Sou terna e dura. Derreto-me de amor e sou austera como um rochedo.
Ele faz o mesmo. Mostra-me como me vê, guiando-me, ensina-me a ensiná-lo. Obriga-me a olhar para mim. É duro comigo, chama-me à razão quando a perco. Ensina-me os limites que às vezes não encontro. Mima-me a toda a hora, escreve-me bilhetinhos de amor, todos os dias me diz que me adora.
Caímos juntos e levantamo-nos juntos também. Erramos e aprendemos. Zangamo-nos muito porque somos iguais. Afastamo-nos, por instantes, e cada reencontro nos deixa mais ligados, mais unidos. Abraçados, choramos e dizemos que não podemos viver um sem o outro. Juramos que não nos voltamos a desentender, que não podemos viver com desencanto, nem perder a magia que nos liga. Diz-me que eu sou o seu norte, se me afasto não sabe por onde seguir, desespera e perde-se, que precisa que eu o guie. Se o deixo solto, se o largo sem regras, nada à sua volta faz sentido, é como se eu não me importasse.
Eu digo que sem ele não respiro, que a minha vida não teria vida, nem cor, nem música, nem poesia, nem nada porque ele vive dentro de mim, eu existo porque ele existe, o meu coração bate porque ele o faz bater. Sem ele não haveria sol, nem azul, nem estrelas, nem flores.
Agradeço-lhe por existir, por me fazer feliz, por ser meu filho, por gostar tanto de mim como sei que gosta, apesar das minhas falhas, das minhas imperfeições, de tantos e tantos erros que cometo.

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