Escrever é um acto tão lindo e intenso como fazer amor (se julgo saber o que isso é). Escrever é mergulhar num mundo impenetrável, tão impenetrável como a intimidade do amor, numa dança onde o corpo e a alma se encontram e se fundem. Implica entrega, descoberta, partilha.
A escrita é um processo aparentemente solitário. Apenas fisicamente solitário, ou talvez nem isso. Para escrever mergulhamos num universo imenso de sensações, emoções e pensamentos. Entramos num jogo de sedução com as palavras, os pensamentos, as sensações. Seduzimos e somos seduzidos por elas ao longo do caminho que nos conduz ao momento em que colocamos o último ponto final.
Umas vezes fogem-nos, escondem-se, deixando-nos na impaciência de quem anseia por ir mais além. Outras, pespegam-se ali mesmo diante do nós, provocadoras, desafiando-nos e ficando à espera que nos aproximemos delas, as agarremos, as puxemos para nós e as tornemos nossas cúmplices. Depois, entregam-se nas nossas mãos, confiantes. Por vezes magoam-nos, causam-nos uma profunda dor, por vezes, deixam-nos apaziguados, quase felizes.
Podemos, nesse momento, iniciar a dança do amor, fazer com elas aquilo que quisermos, e elas permitem, deixando-se seduzir, conduzir, interagindo, seduzindo também, metendo-se por nós adentro, penetrando no nosso intimo e na nossa intimidade. Ganham vida, corpo e alma.
O resultado final é o que menos importa. O encanto reside em cada passo dado em conjunto, na entrega mútua para chegar a uma harmonia tão perfeita e equilibrada como a de uma orquestra em que cada instrumento soa no momento exacto, numa combinação perfeita com todos os outros, completando-se, sem que contudo cada um deles perca a sua individualidade no conjunto, fundindo-se por instantes, num desfecho simultâneo.
Fui percebendo, aos poucos, todo este envolvimento e pergunto-me hoje se alguma vez fiz amor.
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